sábado, 16 de setembro de 2017

Primeira luz para Infraestrutura de Óptica Adaptativa de vanguarda


O Telescópio Principal 4 (Yepun) do Very Large Telescope do ESO (VLT) acaba de ser transformado num telescópio completamente adaptativo.

Após mais de uma década de planeamento, construção e testes, a nova Infraestrutura de Óptica Adaptativa (AOF) viu a sua primeira luz com o instrumento MUSE, tendo capturado imagens extraordinariamente nítidas de nebulosas planetárias e galáxias.

A junção da infraestrutura com o MUSE constitui um dos sistemas tecnológicos mais avançados e poderosos construídos até à data para a astronomia terrestre.



A Infraestrutura de Óptica Adaptativa (sigla do inglês, AOF) é um projeto a longo termo para o Very Large Telescope do ESO (VLT), que pretende fornecer um sistema de óptica adaptativa para os instrumentos montados no Telescópio Principal 4, sendo o MUSE (Multi Unit Spectroscopic Explorer) o primeiro deles.

O MUSE é um espectrógrafo de campo integral, um instrumento poderoso que produz um conjunto de dados tridimensionais do objeto pretendido, onde cada pixel da imagem corresponde a um espectro da radiação emitida pelo objeto. Isto significa que o instrumento cria milhares de imagens ao mesmo tempo, cada uma a um comprimento de onda diferente, obtendo assim uma enorme quantidade e variedade de informação.

A óptica adaptativa trabalha para compensar os efeitos de distorção da atmosfera terrestre, permitindo assim ao MUSE obter imagens muito mais nítidas e com um contraste duas vezes melhor do que anteriormente. O MUSE pode agora estudar objetos do Universo ainda mais ténues.

“Agora, e mesmo com condições atmosféricas não ideais, os astrônomos podem obter imagens de extrema qualidade graças à AOF,” explica Harald Kuntschner, Cientista de Projeto da AOF no ESO.

No seguimento de uma quantidade de testes feitos ao sistema, a equipa de astrônomos e engenheiros viu o seu trabalho recompensado com uma série de belas imagens. Os astrônomos conseguiram observar as nebulosas planetárias IC 4406, situada na constelação do Lobo, e NGC 6369, situada na constelação de Ofiúco. As observações MUSE obtidas com a AOF mostraram enormes melhorias na nitidez das imagens, revelando estruturas em concha nunca antes observadas na IC 4406.




A AOF, que tornou possíveis estas observações, é composta por muitas partes que trabalham em uníssono, incluindo a Infraestrutura de Quatro Estrelas Guia Laser (4LGSF) e o espelho secundário deformável muito fino do Telescópio Principal 4. A 4LGSF lança raios laser de 22 watt para o céu, fazendo brilhar os átomos de sódio que existem na atmosfera superior e produzindo pontos de luz no céu que imitam estrelas. Sensores no módulo de óptica adaptativa GALACSI (Ground Atmospheric Layer Adaptive Corrector for Spectroscopic Imaging) usam estas estrelas artificiais para determinar as condições da atmosfera.

O sistema AOF calcula um milhar de vezes por segundo as correções que devem ser aplicadas para alterar a forma do espelho secundário deformável do telescópio, de modo a compensar os distúrbios atmosféricos. Em particular, o GALACSI corrige a turbulência existente na camada atmosférica que se estende até um quilometro por cima do telescópio. A turbulência atmosférica varia com a altitude, dependendo das condições, no entanto estudos mostram que a maioria dos distúrbios atmosféricos ocorrem nesta primeira camada da atmosfera.

“O que o sistema AOF faz é essencialmente equivalente a elevarmos o VLT 900 metros no ar, “colocando-o” por cima da camada mais turbulenta da atmosfera,” explica Robin Arsenault, Gestor de Projeto da AOF. “No passado, se quiséssemos obter imagens mais nítidas, teríamos que encontrar um sítio melhor ou usar um telescópio espacial — mas agora com a AOF, podemos criar condições muito melhores onde quer que estejamos, por uma fração do custo!”




As correções rápidas e contínuas aplicadas pela AOF melhoram a qualidade da imagem ao concentrarem a luz, que forma imagens mais nítidas e permite ao MUSE resolver detalhes mais minuciosos e detectar estrelas mais ténues do que o anteriormente possível. Atualmente, o GALACSI corrige um grande campo de visão, mas este é apenas o primeiro passo para levar a óptica adaptativa ao MUSE. Está a ser preparado um segundo modo do GALACSI, com a primeira luz prevista para inícios de 2018. Este modo de campo estreito corrigirá a turbulência a qualquer altitude, permitindo observar campos mais pequenos com ainda mais resolução.

“Há dezasseis anos, quando propusemos a construção do revolucionário instrumento MUSE, a nossa ideia era acoplá-lo com outro sistema muito avançado, o AOF,” diz Roland Bacon, Líder de Projeto do MUSE. “O potencial de descobertas do MUSE, já de si enorme, aumentou agora ainda mais. O nosso sonho está a tornar-se realidade.”




Um dos objetivos científicos principais do sistema é observar objetos ténues no Universo longínquo com a melhor qualidade de imagem possível, o que requer tempos de exposição de muitas horas. Joël Vernet, Cientista de Projeto do MUSE e do GALACSI no ESO, comenta: “Em particular, estamos interessados em observar as galáxias mais pequenas e ténues que se encontram às maiores distâncias. Tratam-se de galáxias em formação — ainda na sua primeira infância — que são cruciais para a compreensão da formação galáctica.”




O MUSE não será o único instrumento a beneficiar da AOF. Num futuro próximo, outro sistema de óptica adaptativa chamado GRAAL ficará disponível com o instrumento infravermelho HAWK-I, tornando mais nítida a sua visão do Universo. E a este seguir-se-á depois o novo instrumento muito poderoso, ERIS.

“O ESO lidera o desenvolvimento destes sistemas de óptica adaptativa, sendo o AOF também um precursor para o Extremely Large Telescope do ESO,” acrescenta Arsenault. “Trabalhar no AOF deu-nos — cientistas, engenheiros e indústria — experiências valiosas e competências que usaremos agora para ultrapassar os desafios que a construção do ELT nos lançará.”

Matéria: ASTROPT

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